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domingo, 3 de maio de 2015

Um de meus contos: UMA TRAGÉDIA NÃO GREGA



UMA TRAGÉDIA NÃO GREGA



Ele queria ser intelectual, forçava a barra para parecer inteligente, até chegou a desenvolver um cacoete, que para ele era “Ô cacoete” que só intelectuais possuíam, pelo menos pensava assim. Seu jeito de andar era imponente, como se soubesse responder todas as perguntas do mundo e as que ainda seriam formuladas algum dia. Por isso andava de forma pesada, como se a gravidade agisse de forma diferente em seu corpo – como se andasse com a sapiência do mundo nas costas. 

Sempre que estava sentando em algum canto, colocava a mão no queixo, fazendo pose de pensador, mas não pensava em nada, era apenas uma forma de aparentar ser inteligente, de ser respeitado, mesmo sendo um fingidor.

Nos finais de semana ia para livrarias e folheava os livros de Kant, Dotoieswisk, Focô, Satre, entre tantos pensadores. Os filósofos gregos eram os seus favoritos, seu ego ficava garboso ao folhear um livro de Platão ou Sócrates, mas o que ninguém sabia era que ele apenas lia os prefácios dos livros. Passava horas com um livro de Nietzsche nas mãos, mas nem conseguia escrever o nome do filósofo nem sabia que Zaratustra tinha contado aos quatro cantos que Deus estava morto. Achava que o filósofo alemão tinha nascido na Argentina.

Descobriu-se mais tarde que na verdade ele ficava contemplando o bigode de Nietzsche, pois tinha vontade de ter um bigode como aquele. Achava que se tivesse um bigode feito o de Nietzsche seria idolatrado por gregos e troianos, porém como gostava de tomar sopa, e sua mãe preparava uma sopa como ninguém toda a terça-feira, logo desistira da hipótese de ter um bigode como aquele. Respirava fundo e entristecia o olhar sempre que via o delicioso prato de sopa em cima da mesa a lhe seduzir e ter o sonho de um bigode impecável não se realizar.

Na roda de amigos, se sentia um rei, sempre falava dos filósofos que nunca lera de verdade e por isso era idolatrado por uns e detestado por outros também, que notavam o quão raso era. As garotas lhe desejavam como Eva desejou Adão – e ele se sentido o fruto proibido. Mas tudo termina um dia e ele foi desmascarado. De tão envergonhado tentou ler todos os livros que fingira ter lido em sua vida inteira. Só que o senhor Tempo é imparcial e em um complô com o senhor Morte, lhe ceifaram a vida – antes mesmo dele ter terminado de ler a Divina Comédia e Dom Quixote.

E sua vida permaneceu rasa, e sua morte foi esquecida rapidamente, e o fruto apodreceu na árvore sem ser degustado.                  

Marcos Martins.

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