Fosco
Perguntei aos meus olhos o porquê
de chorarem tanto, um deles me respondeu que era porque eles ardiam em brasa, devido
à dor em ver todo o mal e nada poder fazer.
Meus dias passam lentamente
– o relógio é meu inimigo – e não quero mais saber o porquê de tudo, prefiro a
ausência da visão. Prefiro o nada que me preenche e conforta tanto; prefiro não
tentar montar o quebra-cabeça, faltando peças, que essa vida plástica apresenta
ao meu viver.
Não quero mais ver. Não
quero mais maltratar meus olhos (perderam a inocência há tempos). E esses
colírios, esses colírios que fingem clarear as coisas, só me faz mal – castigo
eterno até que o chão consuma tudo o que minha íris possa ver.
Essas pálpebras que não
fecham para sempre, a cada dia faz com que meus olhos fiquem mais sensíveis – não
aguentam mais ver toda essa culpa, esse raio refratário que bate e marca
profundamente (luz sem cores que ofusca o que gostaria de ver).
Esses olhos acumularam tanta
tristeza ao longo da jornada do herói (que de herói não tem nada, nem jornada a
de ter), esses olhos castanhos, esses olhos neon perdidos no meio do labirinto
vazio-fugaz, que não canso de ver, é impotente de nada poder fazer e calar-se
em panos quentes... Não posso fazer. Ninguém me fortalece.
Essa retina velha que apenas
vê fragmentos de pigmentações indecifráveis, cores cítricas, natureza morta,
mãos que apedrejam; gente sem alma, gente sem olhos – cegos olhos que não
deixam ver todas as cores do arco-íris, porque a película de lágrimas deixa
tudo fora de foco e sem foco, tudo fica mais difícil de tocar, consertar, ver e
algo poder fazer.
Ninguém me fortalece. E o
cristal de minha íris não emite luz própria, não reflete a beleza que todos
dizem o ser ter.
Marcos Martins.
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