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quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Ceifar


Ceifar



Retorcido num canto, fico imóvel e todos não me notam – assim sou feliz.

Meus poemas baratos debocham de mim, sinto minha face dormente, os dedos a sangrar e a escreverem um destino 
– o fardo que vou carregar.

Esta jornada é longa e nem tive tempo para sentar um pouco, mas quando chegar ao fim, terei tido tempo de viver? Viver livre de correntes que me amordaçaram, machucaram minha traqueia deixando minha voz diminuta?

Depois de toda a odisseia, percebo que “tudo” é uma palavra pequena de proporções descomunais e que, tudo, continuou lá, imóvel, escuro, sozinho, retorcido num canto sem sentir minha falta, sem ter visto a minha jornada, sem ter visto.

Todos só me notarão quando meus fluidos começarem a exalar as verdades que não tive coragem de gritar em vida.

Retorcido em meu canto, fico imóvel e assim me sinto feliz, longe da existência que um dia me fez.


Marcos Martins.

3 comentários:

Fábio de Carvalho Multiartista Pernambucano disse...

Talvez eu esteja um pouco sem as palavras para resumir este poema, mas me lembrou muito Augusto Pablo do teu livro Poemas Suicidas... Muito bom. Complexidade aguçada e direção norteada em horizontes de dispersão, de desencontro, de inexistencia...

Marcos Martins - Poeta, escritor e jornalista disse...

obrigado nobre poeta. ; - )

Marcos Martins - Poeta, escritor e jornalista disse...

Essa poema foi da época obscura e dolorosa.